quinta-feira, outubro 03, 2013

...


O homem é uma monstruosa superfície de pântano.
Se o entusiasmo o apanha, então é, sob o aspecto geral,
Como se em algum canto dessa superfície
Uma pequena rã saltasse desajeitadamente na água verde.

(Stefanie Harjes, fragmento do livro: Meu Kafka)

segunda-feira, setembro 09, 2013

Do conhecimento e do ensino

E um homem disse: 

Fala-nos do conhecimento de si próprio. 

E ele respondeu, dizendo:

Vosso coração conhece em silêncio os segredos dos dias e das noites;
Mas vossos ouvidos anseiam por ouvir o que vosso coração sabe.
Desejais conhecer em palavras aquilo que sempre conhecestes em pensamento.

Quereis tocar com os dedos o corpo nu de vossos sonhos. E é bom que o desejeis.
A nascente secreta de vossa alma precisa brotar e correr, murmurando para o mar;
E o tesouro de vossas profundezas ilimitadas precisa revelar-se a vossos olhos.
Mas não useis balanças para pesar vossos tesouros desconhecidos;
E não procureis explorar as profundidades de vosso conhecimento com uma vara ou uma sonda,
Porque o Eu é um mar sem limites e sem medidas.

Não digais: Encontrei a verdade. Dizei de preferência: Encontrei uma verdade.
Não digais: Encontrei o caminho da alma. Dizei de preferência: Encontrei a alma andando em meu caminho.
Porque a alma anda por todos os caminhos.
A alma não marcha em linha reta nem cresce como um junco.
A alma desabrocha, qual um lótus de inúmeras pétalas.

Então, um professor disse:


Fala-nos do ensino.

E ele respondeu, dizendo:
 

Homem algum poderá revelar-vos senão o que já está meio adormecido na aurora do vosso entendimento.
O mestre que caminha à sombra do templo, rodeado de discípulos, não dá de sua sabedoria, mas sim de sua fé e de sua ternura.
Se ele for verdadeiramente sábio, não vos convidará a entrar na mansão de seu saber, mas vos conduzirá antes ao limiar de vossa própria mente.

O astrônomo poderá falar-vos de sua compreensão do espaço, mas não vos poderá dar a sua compreensão.
O músico poderá cantar para vós o ritmo que existe em todo o universo, mas não vos poderá dar o ouvido que capta a melodia, nem a voz que a repete.
E o versado na ciência dos números poderá falar-vos do mundo dos pesos e das medidas, mas não vos poderá levar até lá.

Porque a visão de um homem não empresta suas asas a outro homem.
E assim como cada um de vós se mantém isolado na consciência de Deus, assim cada um deve ter sua própria compreensão de Deus e sua própria interpretação das coisas da terra.

sexta-feira, agosto 30, 2013

De Janeiro a Janeiro

Não consigo olhar no fundo dos seus olhos
E enxergar as coisas que me deixam no ar, deixam no ar
As várias fases, estações que me levam com o vento
E o pensamento bem devagar...


Outra vez, eu tive que fugir
Eu tive que correr, pra não me entregar
As loucuras que me levam até você
Me fazem esquecer, que eu não posso chorar


Olhe bem no fundo dos meus olhos
E sinta a emoção que nascerá quando você me olhar
O universo conspira a nosso favor
A consequência do destino é o amor, pra sempre vou te amar


Mas talvez, você não entenda
Essa coisa de fazer o mundo acreditar
Que meu amor, não será passageiro
Te amarei de janeiro a janeiro
Até o mundo acabar



terça-feira, agosto 27, 2013

Nunca acreditei em charme...


“Nunca acreditei em charme, mistério, fazer de difícil, distância, silêncio. Quero alguém que fique comigo e não com sua própria imaginação.”

segunda-feira, agosto 19, 2013

Madrigal da sombra

Sombra que passas, eu sei que és sombra,
eu sei que és sombra, sombra que falas.
Não deixas passo em nenhuma alfombra
das altas, graves, eternas salas.

Mas os que choram de sala em sala,

mirando espelhos, mirando alfombras,
choram teus passos e tua fala,
e o seu destino de amar as sombras...



Para Jonatas Santos, por mais um ano.
De lucas repetto.
Deixo um abraço fraterno para esse rapaz de sentimento(poesia)s nada descartáveis.

quarta-feira, agosto 14, 2013

Fumo

Para Marcuss, por um momento...


Longe de ti são ermos os caminhos,
Longe de ti não há luar nem rosas,
Longe de ti há noites silenciosas,
Há dias sem calor, beirais sem ninhos!

Meus olhos são dois velhos pobrezinhos
Perdidos pelas noites invernosas...
Abertos, sonham mãos cariciosas,
Tuas mãos doces, plenas de carinhos!

Os dias são outonos: choram... choram
Há crisântemos roxos que descoram...
Há murmúrios dolentes de segredos...

Invoco o nosso sonho! Estendo os braços!
E ele é, ó meu amor, pelos espaços,
Fumo leve que foge entre os meus dedos!...



sexta-feira, julho 26, 2013

eles moram na perdição



a máquina afiou a noite inteira
cansei da espera e adormeci

sonhei que discotecava na sala
ela chegou e me beijou na testa

esperávamos alguém...
mas, o sonho... o cheiro de queimado...

acordei, sobre o travesseiro
havia chumaços de cabelo

saí da cama
decidi não tomar os remédios

à noite, chorei (a primeira vez em anos)
e ela chegou triste como sempre

mas, ao reparar em meu rosto
sorriu

sexta-feira, junho 21, 2013

Fá – Flor – Forte


De frágil apenas à aparência
Pois,
Forte é essa flor chamada
Fá. (de Fabiana)
De alma grande
E bom coração
Não se rendem suas
Pétalas
À tempestade.
É forte,
Se ergue.
Fá,
Flor,
Forte.


 Poemeto dedicado a minha irmã, Fabiana.
Pelo seu aniversário hoje.
Pela sua existência em minha vida.
Pelo seu amor dedicado a mim.
Amo-te, maninha!
de lucas repetto.

sexta-feira, junho 07, 2013

Só então, as trevas.



É preciso lembrar-se, meu amigo, que a vida é curta e que nada no mundo tem existência tão real, tão verdadeira como uma obra de arte. A crítica desaparece, as filosofias mudam, as gerações humanas se extinguem; mas quando o mundo, um dia, se incendiar como um farrapo de papel, então as obras de arte serão as últimas testemunhas vivas que entrarão na casa de Deus. Só então, as trevas. 

Ano 1801


quarta-feira, maio 29, 2013

A Ilha de Cipango



Estou sozinho! A estrada se desdobra
Como uma imensa e rutilante cobra
De epiderme finíssima de areia...
E por essa finíssima epiderme
Eis-me passeando como um grande verme
Que, ao sol, em plena podridão, passeia!

A agonia do sol vai ter começo!
Caio de joelhos, trêmulo... Ofereço
Preces a Deus de amor e de respeito
E o Ocaso que nas águas se retrata
Nitidamente reproduz, exata,
A saudade interior que há no meu peito...

Tenho alucinações de toda a sorte...
Impressionando sem cessar com a Morte
E sentindo o que um lázaro não sente,
Em negras nuanças lúgubres e aziagas
Vejo terribilíssimas adagas,
Atravessando os ares bruscamente.

Os olhos volvo para o céu divino
E observo-me pigmeu e pequenino
Através de minúsculos espelhos.
Assim, que diante duma cordilheira,
Pára, entre assombros, pela vez primeira,
Sente vontade de cair de joelhos!

Soa o rumor fatídico dos ventos,
Anunciando desmoronamentos
De mil lajedos sobre mil lajedos...
E ao longe soa trágicos fracassos
De heróis, partindo e fraturando os braços
Nas pontas escarpadas dos rochedos!

Mas de repente, num enleio doce,
Qual se num sonho arrebatado fosse,
Na ilha encantada de Cipango tombo,
Da qual, no meio, em luz perpétua, brilha
A árvore da perpétua maravilha
A cuja sombra descansou Colombo!

Foi nessa ilha encantada de Cipango,
Verde, afetando a forma de um losango,
Rica, ostentando amplo floral risonho,
Que Toscanelli viu seu sonho extinto
E como sucedeu a Afonso Quinto
Foi sobre essa ilha que extinguiu meu sonho!

Lembro-me bem. Nesse maldito dia
O gênio singular da Fantasia
Convidou-me a sorrir para um passeio...
Iríamos a um país de eternas pazes
Onde em cada deserto há mil oásis
E em cada rocha um cristalino veio.

Gozei numa hora séculos de afagos,
Banhei-me na água de risonhos lagos,
E finalmente me cobri de flores...
Mas veio o vento que a Desgraça espalha
E cobriu-me com o pano da mortalha,
Que estou cosendo para os meus amores!

Desde então para cá fiquei sombrio!
Um penetrante e corrosivo frio
Anestesiou-me a sensibilidade
E a grandes golpes arrancou as raízes
Que prendiam meus dias infelizes
A um sonho antigo de felicidade!

Invoco os Deuses salvadores do erro.
A tarde morre. Passa o seu enterro!...
A Luz descreve ziguezagues tortos
Enviando à terra os derradeiros beijos.
Pela estrada feral dois realejos
Estão chorando meus amores mortos!

E a treva ocupa toda a estrada longa...
O Firmamento é uma caverna oblonga
Em cujo fundo a Via-láctea existe.
E como agora a lua cheia brilha!
Ilha maldita vinte vezes a ilha
Que para todo o sempre me fez triste!

Pau d’Arco – 1904.

segunda-feira, maio 27, 2013

10 Minutos (Dimmi perohé)

Por que você não atende as minhas ligações?
Sei que você tem lá suas razões
Olho milhões de vezes sua foto
Me pergunto em que ponto perdemos o foco
Por que você não atende, se vê que sou eu?
Será que é teu jeito de dizer adeus?
Rodo mil estórias na minha cabeça
Daqui a 10 minutos talvez eu enlouqueça
Fora!
Seu silêncio me devora
Algo diz pra eu ir embora
Não entendo os seus sinais
Mas fica com você
A desculpa para inventar
Quando resolver ligar
Posso não te querer mais
Olho pra pessoa em que você me transformou
E depois não quis mais, abandonou
Vejo que a vida me prestou esse favor
Me fez sempre pronta pra viver um novo amor
Um novo amor

sexta-feira, maio 24, 2013

A esperança



A Esperança não murcha, ela não cansa,
Também como ela não sucumbe a Crença.
Vão-se sonhos nas asas da Descrença,
Voltam sonhos nas asas da Esperança.

Muita gente infeliz assim não pensa;
No entanto o mundo é uma ilusão completa,
E não é a Esperança por sentença
Este laço que ao mundo nos manieta?

Mocidade, portanto, ergue o teu grito
Sirva-te a Crença de fanal bendito,
Salva-te a glória no futuro – avança!

E eu, que vivo atrelado ao desalento,
Também espero o fim do meu tormento,
Na voz da Morte a me bradar: descansa!


terça-feira, maio 21, 2013

de Mozart a Nannerl



Caríssima irmã,



Há muito não lhe escrevo, pois andava ocupado com minha ópera, mas como agora tenho tempo, estarei mais atento a esse meu dever. A ópera, Deus seja louvado, é um sucesso, pois todas as noites o teatro está cheio, para o grande espanto de todos, pois várias pessoas dizem que, desde que estou em Milão, nunca viram tamanhas multidões em uma primeira ópera. Papai e eu, graças a Deus, estamos bem, e espero que na Páscoa já possa contar tudo pessoalmente a você e a mamãe. Addio. Beijo a mão de mamãe. A propósito! Ontem a copista nos chamou e disse ter recebido ordens de transcrever minha ópera para a corte de Lisboa. Enquanto isso, adeus, minha querida mademoiselle irmã. Tenho a honra de ser, e continuar sendo por toda eternidade,



seu fiel irmão.

(ano 1770) 





Fragmento: As vidas Ilustradas dos Grandes Compositores

segunda-feira, maio 13, 2013

A carta de Mozart ao Abbé Bullinger sobre a morte da mãe, 3 de julho de 1778.


Meu mais querido amigo!

Só para você.

Lamente-se comigo, meu amigo! Este foi o dia mais triste de minha vida — escrevo esta às duas horas da manhã. Preciso dizer-lhe que minha mãe, minha querida mãe, faleceu! Deus a chamou para Si. Era sua vontade leva-la, isso pude ver claramente — por isso resignei-me à Sua vontade. Ele a deu para mim, por isso Ele tinha o direito de tirá-la de mim. Pense, porém, em toda a minha ansiedade, nos temores e tristezas que tive de suportar nos últimos quinze dias. Ela estava praticamente inconsciente no momento de sua morte — sua vida apagou-se como a chama de uma vela. Três dias antes de morrer ela se confessou, recebeu o Sacramento e a extrema-unção. Durante os últimos três dias, no entanto, delirou constantemente e hoje, às cinco horas e vinte e um minutos, a agonia da morte começou e ela perdeu todas as sensações e a consciência. Apertei-lhe a mão e falei com ela — mas ela não me viu, não me ouviu, todos os seus sentidos haviam desaparecido. Ela ficou assim até ter expirado, cinco horas depois, às dez horas e vinte e um minutos. Só estávamos presentes eu, Herr Haina (um gentil amigo que meu pai conhece) e a enfermeira. É impossível para mim descrever hoje todo o decorrer de sua doença, mas estou firmemente convencido de que ela estava predestinada a morrer e que Deus assim o havia ordenado. Tudo que lhe peço neste momento é que represente o papel de um verdadeiro amigo, preparando meu pobre pai com muito cuidado para esta triste notícia. Escrevi uma carta para ele, por este mesmo correio, mas só para dizer que ela está seriamente doente; e agora só para dizer que ela está seriamente doente; e agora vou esperar que ele me responda, e guiar-me por essa resposta. Que Deus dê a ele força e coragem! Oh, meu amigo! Não me sinto consolado só agora, como há algum tempo venho tendo consolo. Com a misericórdia de Deus suportei tudo com firmeza e compostura. Quando a doença dela se tornou perigosa, supliquei a Deus apenas duas coisas — uma morte feliz para ela, e força e coragem para mim mesmo; e Deus, em Sua bondade, ouviu minha prece e me concedeu essas duas bênçãos com máxima prodigalidade. Suplico-lhe, portanto, meu mais querido amigo, que cuide de meu pai por mim e tente dar-lhe coragem, de forma que, quando ele souber do pior, não receba o golpe com muita dureza. Recomendo-lhe também minha irmã, de todo o meu coração. Vá procurá-los imediatamente, eu lhe imploro — mas não lhes conte que ela já morreu — apenas prepare-os para isso. Faça o que achar melhor — use todos os meios possíveis para consolá-los — mas aja de forma a tirar-me esse peso da cabeça — e que eu não precise temer um novo golpe. Cuide de meu querido pai e minha querida irmã para mim. Responda-me imediatamente, eu lhe imploro. Adieu, Seu criado mais obediente e grato.

Wolfgang Amadè Mozart


A mãe de Mozart, Anna-Maria.
Retrato de artista descohecido, c. 1775 (Mozarteum de Salzburgo)



Fragmento: As vidas Ilustradas dos Grandes Compositores