terça-feira, abril 10, 2012

O mistério


Na morte, não. Na vida.
Está na vida o mistério.
Em cada afirmação ou
abstinência.
Na malícia
das plausíveis revelações,
no suborno
das silenciosas palavras.

Tu que estás morto
esgotaste o mistério.

Ora a distância perseguias,
ora recuavas.
Era apogeu ou o nirvana
que tateando buscavas?

Ah! Talvez fosse a morte.

Não se sabia quando vinhas
nem quando partias. Eras
o Esperado e o Inesperado.

Grandes navios viajavas
com a mesma estranha gratuidade
com que ao planalto descias
por uma escada de nuvens.
Belo de inconstância e arrojo
com teu lastro de intuições,
a um apelo da noite
todo te entregavas, trêmulo
entre carícias e tempestades.

Que mundo vinha nascendo?

Ah! Talvez fosse a morte.

Conheceste os suspiros,
o lento disfarce do sangue,
as rosas do espírito, as secas
rosas nos dedos trituradas.

Por uma solução ansiavas...

Ah! Talvez fosse a morte.

Agora estás poderoso
de indiferença, de equilíbrio.
Completo em ti mesmo, forro
de seduções e amarras.
Nada te açula ou tolhe.
És todo és um, apenas.
A plenitude da água,
da pedra, tens.
E és natural, és puro, és simples como
a água, a pedra.


Fragmento: Flor da Morte — Henriqueta Lisboa

0 comentários:

Postar um comentário